segunda-feira, 8 de maio de 2017
Três verbos que
caracteriz@m o dom do discernimento
Reconhecer - O reconhecimento diz respeito antes de tudo aos
efeitos que os acontecimentos da minha vida, as pessoas com as quais me
encontro, as palavras que ouço ou que leio produzem na minha interioridade: uma
variedade de “desejos, sentimentos, emoções” (Amoris laetitia, 143) de natureza
muito diferente: tristeza, obscuridade, plenitude, medo, alegria, paz, sensação
de vazio, ternura, raiva, esperança, tibieza, etc. Sinto-me atraído ou impelido
numa pluralidade de direções, sem que nenhuma delas me pareça como aquela que
claramente devo tomar; é o momento dos altos e baixos, e em certos casos de uma
autêntica luta interior. Reconhecer requer que se traga à tona esta riqueza
emocional e que se mencionem estas paixões, mas sem as julgar. Exige também que
se sinta o “gosto” que elas deixam, ou seja, a consonância ou dissonância entre
o que eu experimento e aquilo que existe de mais profundo em mim. Nesta fase a
Palavra de Deus reveste uma grande importância: com efeito, meditá-la põe em
movimento as paixões, assim como todas as experiências de contato com a própria
interioridade, mas ao mesmo tempo oferece uma possibilidade de as fazer
sobressair, identificando-se nas vicissitudes que ela narra. A fase do
reconhecimento coloca no centro a capacidade de escuta e a afetividade da
pessoa, sem se subtrair por medo ao cansaço do silêncio. Trata-se de uma
passagem fundamental no percurso de amadurecimento pessoal, de maneira
particular para os jovens que experimentam com maior intensidade o vigor dos
desejos e podem sentir-se também assustados diante deles, talvez renunciando
aos grandes passos para os quais contudo se sentem impelidos.
Interpret@r - Não é suficiente reconhecer aquilo que nós
experimentamos: é necessário “interpretá-lo” ou, em outras palavras,
compreender para o que o Espírito nos chama através daquilo que suscita em cada
um. Muitas vezes detemo-nos a narrar uma experiência, ressaltando que “ficamos
deveras impressionados”. Mais difícil é compreender a origem e o significado
dos desejos e das emoções sentidas e avaliar se eles nos orientam numa direção
construtiva ou, pelo contrário, se nos levam a fechar-nos em nós mesmos.
Esta fase de interpretação é muito delicada; exige paciência, vigilância
e também uma certa aprendizagem. Devemos ter a capacidade de estar cientes dos
efeitos dos condicionamentos sociais e psicológicos. Isto requer que se ponham
em campo também as próprias faculdades intelectuais, contudo sem cair no risco
de construir teorias abstratas sobre aquilo que seria bom ou bonito fazer: até
no discernimento, “a realidade é superior à ideia” (Evangelii gaudium, 231). Na
interpretação, não podemos nem sequer descuidar do confronto com a realidade e
a consideração das possibilidades que objetivamente temos à disposição.
Para interpretar os desejos e os impulsos interiores é necessário
confrontar-se honestamente, à luz da Palavra de Deus, também com as exigências
morais da vida cristã, procurando inseri-las sempre na situação concreta de
vida. Este esforço impele quem o envida a não se contentar com a lógica
legalista do mínimo indispensável, procurando ao contrário o modo de valorizar
da melhor maneira os dons pessoais e as próprias possibilidades: por isso,
trata-se de uma proposta atraente e estimulante para os jovens.
Este trabalho de interpretação realiza-se num diálogo interior com o
Senhor, com a ativação de todas as capacidades da pessoa; no entanto, a ajuda
de um especialista na escuta do Espírito constitui um apoio inestimável, que a
Igreja oferece e do qual é pouco prudente não lançar mão.
Escolher - Uma vez reconhecido e interpretado o mundo dos
desejos e das paixões, o ato de decidir torna-se exercício de autêntica liberdade
humana e de responsabilidade pessoal, obviamente sempre situadas e portanto
limitadas. Por conseguinte, a escolha subtrai-se à força cega dos instintos,
aos quais um certo relativismo contemporâneo acaba por atribuir o papel de
critério último, aprisionando a pessoa na volubilidade. Ao mesmo tempo,
liberta-se da sujeição a instâncias externas à pessoa e, portanto, heterónomas,
exigindo igualmente uma coerência de vida. [...] A decisão deve ser posta à
prova dos acontecimentos, tendo em vista a sua confirmação. A escolha não pode
permanecer prisioneira numa interioridade que corre o risco de permanecer
virtual ou irrealista – trata-se de um perigo acentuado na cultura
contemporânea – mas é chamada a traduzir-se em ação, a encarnar, a dar início a
um percurso, aceitando o risco de se confrontar com aquela realidade que tinha
posto em movimento desejos e emoções. Nesta fase surgirão outros ainda:
reconhecê-los e interpretá-los permitirá confirmar a bondade da decisão tomada
ou aconselhará a revê-la. Por isso, é importante “sair” também do medo de errar
que, como vimos, pode tornar-se paralisante.
Fonte: DOCUMENTO PREPARATÓRIO - SÍNODO DOS BISPOS 2018 - XV ASSEMBLEIA
GERAL ORDINÁRIA - Os jovens, a fé e o discernimento vocacional.
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